As tendências Crítico-Social dos Conteúdos e Histórico-Crítica podem parecer complicadas de se entender, às vezes devido a falta de um bom material de estudo e com pouca fundamentação teórica.

Por isso, depois de ter um primeiro contato com uma fundamentação teórica mais ampla, a sua dificuldade irá diminuir ou até desaparecer. E é isso que eu lhe garanto aqui neste artigo. Leia até o final e entenda de uma vez!

 

1- As duas tendências pedagógicas são iguais?

A resposta é: não.

Porque a Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos foi desenvolvida por José Carlos Libâneo e a Pedagogia Histórico Crítica foi desenvolvida por Dermeval Saviani.

Entretanto, ambas tendências possuem os mesmos pressupostos: uma pedagogia que seja crítica, pois considera os condicionantes sociais objetivos diante da educação, mas, além disso, propõe formas de superação dessa realidade a partir da instrumentalização da classe dominada através do domínio do saber sistematizado.

Em outras palavras: crê que a escola está determinada pela classe dominante, mas crê que é através do domínio dos conteúdos, do saber sistematizado pelo conjunto da humanidade, que o sujeito irá se “instrumentalizar” para modificar essa sociedade.

A pedagogia proposta por Saviani e Libâneo compreende que a sociedade é desigual e a educação não corresponde aos interesses das classes populares. Portanto, para que o sujeito tenha uma participação ativa na democratização da sociedade, é preciso que ele saiba atuar nos ambientes ocupados pela classe dominante. E, para isso, é preciso que ele tenha acesso de qualidade ao mesmo saber, a mesma formação intelectual que a classe dominante possui, que é conhecimento historicamente sistematizado.

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Além disso, ambos têm a mesma fundamentação teórica: materialismo dialético. Contudo, é na Pedagogia Histórico-Crítica de Dermeval Saviani que essa referência teórica e filosófica é mais fundamentada.

Algumas bancas cobram essas tendências como se fossem variações de uma mesma tendência por terem sido elaboradas em cima de uma mesma concepção de educação. Enquanto isso, outras bancas cobram no edital: “Tendências Pedagógicas e Pedagogia Histórico Crítica”, de modo separado. Então, além de você compreender a raiz das duas, é importante saber a especificidade de cada uma isoladamente.

A partir da década de 1970 vão emergir discussões acerca do modelo de pedagogia oficial e a busca de alternativas a ela. Procurava-se uma nova forma de educação que rompesse com esse mecanismo de dominação e propusesse uma prática pedagógica crítica.

Libâneo vai dizer no artigo “Fundamentos Teórico-Metodológicos Da Pedagogia Crítico-Social (perspectiva histórico-cultural)” (2010) que na segunda metade da década de 70 “vários intelectuais do campo da educação assumiram posições marxistas, em boa parte sob a orientação de Dermeval Saviani” e assume que “a pedagogia crítico-social dos conteúdos surgiu como uma versão da pedagogia histórico-crítica voltada para a didática” (p. 1).

Críticas às teorias crítico-reprodutivistas

Nessa mesma época foram desenvolvidas as teorias crítico-reprodutivistas, que foram consideradas insuficientes. Como já foi trazido em um outro artigo daqui do blog, essas teorias somente criticavam a pedagogia oficial e concluíam que toda e qualquer atuação na educação já era em si reprodutora das condições sociais vigentes e tinha seu fim nisso mesmo.

Boa parte dos professores não ficaram satisfeitos com essa conclusão reprodutivista e acreditaram na possibilidade de uma educação que não fosse reprodutora e que atendesse aos interesses da classe dominada.

Buscava-se então compreender a educação dentro do fenômeno histórico, o que implica levar em consideração que a educação passou e passa por transformações, mudanças. Porque a sociedade não é estática, está sempre mudando ano após ano, década após década. Ela se transforma, é dinâmica e contraditória, porque ora segue um padrão, ora segue outro. Ou seja, a sociedade tem um caráter contraditório “cujo desenvolvimento conduz à transformação e, mais tarde, à sua própria superação” (SAVIANI, 2013, p. 79).

Nova concepção que compreende a educação dentro da história

Logo, as pedagogias Histórico-Crítica e a Crítico-Social dos Conteúdos buscam compreender a educação dentro dessas transformações e contradições históricas da sociedade. Essa educação que é fruto dos resultados das mudanças ao longo da história e continua sendo passível de transformação.

A dimensão dialética está nessa compreensão da educação como contraditória e determinada por condicionantes sócio-históricos, no entanto propõe a possibilidade de articulação de uma proposta pedagógica que tenha como compromisso a transformação da sociedade e não sua manutenção e perpetuação.

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Pressupostos históricos

A Pedagogia Histórico Crítica começou a tomar forma no artigo “Escola e democracia: para além da teoria da curvatura da vara” publicado na revista ANDE em 1982, tornando-se o livro “Escola e Democracia” em 1983. Até então ela era uma “nova teoria pedagógica”, não possuía ainda um nome. Essa nova teoria pedagógica foi denominada pedagogia histórico-crítica em 1984.

Ao estudar a filosofia da educação, Saviani vai chegar à conclusão de que no Brasil, até então, não havia uma reflexão sistematizada, ou seja, estruturada e explícita de caráter dialético sobre a questão educacional. Para ele, as teorias crítico-reprodutivistas traziam uma abordagem “dialética idealista”, uma “dialética de consciências” porque no fim não trazem uma proposta de superação, só de “reflexão” (digamos assim).

Diante da insatisfação das análises das teorias crítico-reprodutivistas, por tudo aquilo que eu já trouxe na aula 04, aumentaram as exigências de uma análise do problema educacional que desse conta de seu caráter contraditório e que, ao mesmo tempo, orientasse práticas pedagógicas articulando com os interesses populares em transformar a sociedade.

Fazia-se necessária uma teoria crítica não reprodutivista da educação. É daí que surge a denominação “tendência histórico-crítica”, como Saviani mesmo conta no livro “Pedagogia Histórico-Crítica”, relacionada a uma concepção de educação que leva em consideração os condicionantes sociais, mas, além disso, os relaciona à dimensão histórica que o reprodutivismo não alcançou.

 

A expressão pedagogia histórico-crítica é o empenho em compreender a questão educacional com base no desenvolvimento histórico objetivo. Porque uma possível denominação de “pedagogia dialética” não seria suficiente, já que naquela época (década de 1970) os debates no contexto acadêmico se misturavam entre os crítico-reprodutivistas e críticos.

Dermeval Saviani considera o ano de 1979 como sendo o marco da pedagogia histórico crítica. Este é o ano em que ele assume a primeira turma de doutorado em educação da PUC-SP, na qual ele orientou 11 alunos. Este grupo de pesquisadores tinham como problema central a superação do crítico-reprodutivismo. “Começava-se a tentar descobrir formas de analisar a educação, mantendo presente a necessidade de criar alternativas e não apenas fazer a crítico do existente” (p. 2).

Portanto, se no cenário reprodutivista era impossível a atuação crítica do professor porque era entendido que a educação se encerrava nesta luta de classes já vencida pela classe dominante, agora começa-se a desenvolver uma concepção de educação que encontra saídas para a questão pedagógica a partir de uma valorização da escola como instrumento importante para as camadas dominadas.

E é nesse contexto que o trabalho de José Carlos Libâneo ganha relevância. Mais precisamente no livro “Democratização da Escola Pública”, no qual ele se empenha em analisar a prática dos professores em cada tendência e, também, redefine a didática à luz desta nova concepção de educação, a qual ele denomina “Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos”.

Referências à Psicologia histórico-cultural de Vygotsky

Possui pressupostos psicológicos baseados na Psicologia histórico-cultural de Vygotsky, pois considera importantíssimo o papel mediador do professor no processo de aprendizagem do estudante. Logo, foge de uma perspectiva não-diretiva. Para esse desenvolvimento ocorrer, é necessário que o aluno tenha um par mais desenvolvido, alguém que saiba reconhecer suas pendências psicológicas. Nesse sentido, entende-se que uma criança ensina a outra, mas não necessariamente entende as pendências psicológicas dela, logo, quem é capaz de resolver suas pendências é o professor.

Leia e saiba também:Tendências Pedagógicas Progressistas: Libertadora e Libertária – Libâneo e Saviani

Resumindo os pontos em comum:

2- Pedagogia Histórico-Crítica

Pedagogia histórico-crítica, como já dito antes, traz uma concepção dialética de educação, sobretudo, especificamente para sua versão do materialismo histórico a qual compreende que as relações sociais são determinadas pelas condições materiais da existência humana, ou seja, a questão educacional é compreendida a partir do desenvolvimento histórico objetivo.

Traz como bases psicológicas a psicologia histórico-cultural desenvolvida pela escola de Vygotsky. Há também outros autores que foram fontes específicas de seu trabalho: Bogdan Suchodolski, Mario Manacorda e Georges Snyders.

Sua fundamentação teórica se baseia nos aspectos filosóficos, históricos, econômicos e político-sociais abordadas nas investigações de Karl Marx sobre as condições históricas de produção da existência humana que resultaram na forma da sociedade atual dominada pelo capital.

Reporta-se ao texto de Marx “Método da economia política” que está no livro “Contribuições à crítica da economia política” (1973), no qual Marx explicita o movimento do conhecimento como a passagem do empírico ao concreto pela mediação do abstrato. Ou a passagem da síncrese à síntese, pela mediação da análise.

Três momentos da mediação

A educação é entendida como mediação no interior da prática social global, logo, o ponto de partida e o ponto de chegada é a prática social. Essa mediação explicita-se em três momentos:

PROBLEMATIZAÇÃO INSTRUMENTALIZAÇÃO CATARSE
Identificação de questões levantadas pela prática social, momento intermediário ao método. Disposição de instrumentos teóricos e práticos para a sua compreensão e solução. Viabilização de sua incorporação como elementos integrantes da própria vida dos alunos.

Saviani não vê problema algum em apresentar as características do método pedagógico da pedagogia histórico-crítica simetricamente em “cinco passos”.

Mas que fique claro que essa abordagem feita por Saviani se trata de um esforço heurístico e didático apenas para fins de compreensão, pois ele mesmo considera que é mais apropriado falar em “momentos articulados num mesmo movimento, único e orgânico” do que em “passos que se ordenam numa sequência lógica”. Segue:

“Passos” Descrição
Prática Social É o ponto de partida comum ao professor e aluno, mas ambos se encontram em níveis diferentes de compreensão. O professor tem uma compreensão sintética precária da prática social do aluno e o aluno tem uma compreensão sincrética (como já foi explicado anteriormente).
Problematização É o momento em que há identificação dos principais problemas postos pela prática social que precisariam ser resolvidos. Após isso, procura-se saber quais conhecimentos é necessário dominar para resolver essas questões.
Instrumentalização É o momento em que as camadas populares se apropriam dos instrumentos teóricos e práticos (ferramentas culturais) necessários para resolver as problemáticas levantadas da prática social, ferramentas necessárias na luta social travada por eles para se libertarem das condições de exploração em que vivem. Como esses instrumentos são produzidos socialmente e preservados historicamente (são os conhecimentos), a sua apropriação depende direta ou indiretamente da atuação do professor.
Catarse Efetiva incorporação dos instrumentos culturais, transformados agora em elementos ativos de transformação social na vida dos alunos. É considerado o ponto culminante do processo educativo.
Prática Social A prática social agora é o ponto de chegada. Aqui, o aluno e o professor não estão mais na mesma condição que estavam no ponto de partida. Aluno sai da condição de pensamento sincrético para sintético. Nesse momento, o nível de compreensão dos alunos é elevado ao nível do professor e o professor já compreende melhor a realidade do aluno, reduz-se sua precariedade.

Leia e saiba também:Tendências Pedagógicas Progressistas: Libertadora e Libertária – Libâneo e Saviani

Resumo dos principais pontos

3- Pedagogia Crítico-Social dos Conteúdos

Para Libâneo, a valorização do ensino é o melhor serviço que se presta aos interesses das classes populares. Para ele, o bom ensino é a condição para que a escola sirva aos interesses populares, o ensino pela apropriação dos conteúdos escolares básicos que tenham ressonância na vida dos alunos.

Conhecimento da prática social do aluno

Considerando que a prática social é o ponto de partida e o trabalho docente é inseparável desta, Libâneo vai dizer que a primeira preocupação do professor é o conhecimento da prática social do aluno, sua prática de trabalho e de sua vida: “suas condições socioculturais (vida familiar, ambiente social, conhecimentos e experiências de que já dispõe, reações diante do estudo das matérias, disposições psicológicas como motivação, autoconceito, linguagem, expectativas em relação ao futuro) e o quadro das relações em que vive” (p.83). Portanto, a prática pedagógica não é realizada de qualquer maneira, sem uma diretividade. Ela é planejada, sistemática, intencional, disciplinada.

Os métodos são subordinados aos conteúdos

Os métodos precisam favorecer a relação entre o saber e a realidade da prática social do estudante. Libâneo vai dizer que uma aula começa pela constatação da prática real e em seguida a consciência dessa prática relacionada ao conteúdo proposto pelo professor, “na forma de um confronto entre a experiência e a explicação do professor”. “Vai-se da ação à compreensão e da compreensão à ação, até a síntese, e o que não é outra coisa senão a unidade entre a teoria e a prática”.

É por isso que Libâneo preconiza a formação docente do professor visando o conhecimento e domínio dos processos pedagógicos. Em outras palavras: para que o professor possa contribuir de maneira efetiva na aprendizagem do aluno, ele deveria ter uma formação acadêmica e social no sentido de adquirir habilidades para relacionar os conhecimentos científicos com as contradições da realidade, a fim de problematiza-la com os alunos.

Leia e saiba também:Tendências Pedagógicas Renovadas e Escola Nova – Libâneo e Saviani

Características objetivas

Na aula 06 da Série Teorias e Tendências Pedagógicas no meu canal do YouTube eu falei sobre essas duas tendências pedagógicas. Nessa aula eu encerro os estudos sobre as tendências pedagógicas e abordo todos os aspectos dessas duas tendências, desde o contexto histórico até as características mais específicas de cada pedagogia.

Leia e saiba também:Ciclo de Estudos para concursos de professor

Playlist completa “Teorias e Tendências Pedagógicas”

É uma aula completa de 40 minutos de duração que vai esclarecer todas as suas dúvidas neste conteúdo e ao final da aula ainda resolvo questões de concurso com você. E você ainda pode acelerar a reprodução do vídeo para otimizar o seu tempo de estudo.

Então assista e depois me conte se eu te ajudei, combinado?!

Deixe um comentário abaixo me contando o que você aprendeu comigo neste artigo!

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